Neve em Mondonhedo

Nevada en Mondoñedo 1963

Por José-Martinho Montero Santalha (*)

 

É muito infrequente que neve em mondonhedo (e menos ainda em Lourençá). Nas raras ocasiões em que isso acontece, é fenómeno leve, de escassa intensidade e de curta duração. Somente de raro em raro, quando se dá uma forte nevada geral que afecte a todo o norte da península, pode haver em Mondonhedo uma capa de neve que dificulte as actividades comuns e as comunicações e que perdure vários dias.

Da minha experiência vital em 6 anos de residência mindoniense (1959-1965) queda a lembrança, repetida, de que alguns anos podia ver-se durante uns dias algo de neve nos terrenos da aba setentrional do monte Padornelo, e talvez nalgum outro dos montes que rodeiam o vale. mas não afectava à zona urbana nem à planície.

 

A nevada do 1963

A nevada mais forte que recordo deu-se em fevereiro de 1963. A ela correspondem as duas fotografias que reproduzo, feitas desde o alto do pavilhão novo (o dos filósofos). Nelas podem ver-se as casas vizinhas aos muros dos campos deportivos do Seminário Menor, com os telhados cobertos de uma ligeira capa de neve, e as hortas do vale, tão férteis, revestidas de branco.

A imprensa informava por esses dias de começos de fevereiro que havia frio e neve por grande parte da europa.

Por exemplo, o jornal luguês El Progreso abria o domingo 3 de fevereiro com o titular “Lugo, cubierto por la nieve”, acompanhado de várias fotos da cidade nevada.

Alrededores del Seminario febrero 1963

Noutras informações ampliava as notícias, com referência a outros territórios igualmente nevados. Em primeiro lugar, o resto da província: “una impresionante nevada ha descargado ayer sobre la capital y su provincia”. Entre os diversos pontos da província cobertos pela neve citavam-se Monforte, Viveiro, Ribadeu…

Como essa corrente de frio procedia do este, informava-se que a neve cobrira grande parte da península: Zaragoza, Barcelona…: “se intensifican las nevadas en casi toda la península” (“exceptuando las zonas de Andalucía y Extremadura”).

E também na europa continental.

 

Lagos suíços congelados

Uns anos mais tarde, residindo eu já em Roma (onde tampouco neva quase nunca, apesar de que a neve dos Apeninos não fica longe), fui passar umas semanas a uma localidade suíça, Romanshorn, na beira do lago de Constança (o Bodensee), que divide Suíça de Alemanha, convidado pelo párroco, com o qual meu pai tinha amizade desde que passara algum tempo trabalhando ali. e contavam-me que, durante essa nevada de 1963, todo o lago se congelara, de maneira que, a pesar de estar desaconselhado pelas autoridades, a gente foi passear e esquiar sobre o gelo, e alguns mesmo chegaram até a cidade alemã fronteira, Friedrichshafen (onde se fabricou o dirigível Zeppelin. Desde Romanshorn a Friedrichshafen havia uma dúzia de quilómetros, e um serviço de passageiros que fazia habitualmente a travessia do lago. Nele fui uma tarde visitar a cidade, que me impressionou porque havia zonas reconstruídas em casas baratas, pois, por ter fábrica de aviões, fora bombardeada intensamente pela aviação aliada durante a segunda guerra mundial).

Leio em internet que o lago de Constança se congela completamente de maneira periódica, pelo menos uma vez por século. Existe mesmo uma tradição de realizar uma festa religiosa, com procissão por cima do lago gelado, que congrega as populações de ambas as margens, suíça e alemã.

Que os rios e lagos centroeuropeus se congelem não é frequente, mas já há registradas várias ocorrências históricas. A anterior a 1963 sucedera em 1929. Sobre ela dispomos de um formoso testemunho do futuro grande filólogo catalão Joan Coromines (meu saudoso mestre e amigo), que passou parte da sua mocidade estudando em Suíça. Em março de 1929 escrevia em carta dirigida aos seus pais desde a zona de Zurich: congelara-se também o lago Vizinho, e a gente saíra passear sobre o gelo (traduzo do catalão):

  “Desde o luns começou a fazer um frio terrível; esta manhã o termómetro da porta marcava 16 graus baixo zero e, segundo a imprensa, chegou-se a 23. o lago de zurich congelou-se, cousa que não passara desde hai trinta anos, e hai um barquinho que passa todo o dia andando arriba e abaixo diante da cidade para conservar um pequeno espaço de água livre, onde se refugiaram todas as embarcações que faziam o serviço de transporte. para evitar que o excessivo encerramento nos fosse perjudicial, o domingo pela tarde fomos em trem até stäfa, um povo na costa do lago onde o gelo era mais sólido, e gozamos do prazer de um passeio por cima do gelo, uma espécie de expedição polar em pequeno. todo zurich se trasladara a stäfa, uns para patinar, outros para caminhar sobre o gelo, outros para mirar, de tal maneira que, apesar de irmos com tempo, tivemos que fazer a viagem no furgom das equipagens; despois saíram vários trens especiais. no lago havia uma multitude imensa, certamente mais de dez mil pessoas de todas as idades”.

Crónica de “El Progreso” de Lugo (texto del periódico escaneado)

O colapso do Império Romano

É possível que com uma vaga de frio tivesse também relação o surpreendente colapso do Império Romano ante o empuxe dos germanos (os “bárbaros”) no dia de fim de ano do 407.

O primeiro que ao parecer formulou essa hipótese foi o grande historiador inglês do século XVIII Edward Gibbon (1737-1794) na sua magna obraTthe History of the Decline and Fall of the Romam Empire (1776-1788): conjecturou que, tendo em conta a defensa militar, magnificamente organizada, que os romanos tinham na margem esquerda do rio Rhin para impedir o passo dos germanos, um fenómeno como o congelamento do rio poderia ter desarmado a eficácia defensiva da estrutura militar romana:

 

  [As forças confederadas dos germanos] “no derradeiro dia do ano, numa ocasião em que as águas do rhin estavam mui provavelmente geladas, penetraram, sem oposição, nos indefensos territórios da gália. esta memorável passagem dos suevos, vándalos, alanos e burgúndios, que nunca depois se retiraram, pode considerar-se como a caída do império romano nos países de além dos alpes; e as barreiras que até então separaram as nações selvagens e as civilizadas, quedaram desde esse fatal momento rebaixadas ao chão”.

 

(*) Biografía de José-Martinho Montero Santalla

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